O comerciante George Araújo de Souza, acusado de matar Kerolly Alves Lopes, de 11 anos, baleada na cabeça ao defender o pai durante uma briga, participou da audiência de instrução para seu julgamento na tarde desta quinta-feira (6), em Aparecida de Goiânia, Região Metropolitana da capital. Ao término da sessão, a irmã da vítima, Pérola Alves Lopes, 14, que também estava presente no dia do crime, questionou o acusado sobre o ocorrido. “Por que você matou minha irmã?”, perguntou ela. Com a voz embargada e chorando, George respondeu: “Você sabe que eu não queria matar vocês. Mas me arrependo de tudo e peço perdão pela dor que causei a sua família”, disse.
A audiência foi realizada na 4ª Vara Criminal de Aparecida de Goiânia e presidida pelo juiz Leonardo Fleury Curado Dias. Foram ouvidas sete testemunhas, sendo cinco de defesa e três de acusação, incluindo o pai de Kerolly, o serralheiro Sinomar Firmino Lopes, e Pérola. O comerciante, que responde por homicídio e dupla tentativa de homicídio, também foi interrogado pelo juiz e deu a sua versão sobre os fatos.
O crime aconteceu no dia 27 de abril do ano passado. Kerolly foi baleada durante uma briga entre o pai e o comerciante. Dizendo ter sido ameaçado, Sinomar foi até a pizzaria de George, acompanhado das filhas, para tirar satisfação e o homem acabou efetuando disparos contra a família. Imagens do circuito se segurança do estabelecimento registraram toda a ação. Kerolly foi atingida na cabeça e ficou 10 dias internada na UTI do Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo). Ela teve morte cerebral constatada no dia 5 de maio de 2013. Dois dias depois, ela morreu por falência múltipla de órgãos.
Primeiro a ser ouvido, Sinomar pediu que George deixasse a sala. Ele contou que tudo começou por conta da demora em receber uma pizza. “Eu estava lá acompanhado da minha família e pedi duas pizzas e um refrigerante, que foi servido rapidamente. Mas as pizzas não vinham e não deu mais para esperar. Aí levantei e disse que iria pagar apenas o refrigerante e coloquei minha carteira, que estava cheia de moedas, em cima do balcão de vidro. Aí ele quebrou [o balcão] e o George começou a discussão”, contou o homem.
Ainda segundo ele, durante a briga, George deu um tapa em seu rosto. “Eu fiquei muito bravo, mas minhas filhas me seguraram e fomos embora. Antes de sair ele disse que iria dar um jeito em mim”, relatou. Depois disso, segundo Sinomar, boatos deram conta de que George estava à sua procura. “Dois meses depois eu decidi ir ao local para resolver a situação e pagar pelo balcão. Eu estava com as minhas filhas, pois saímos para comprar um presente para a Pérola, que fazia aniversário. Na volta eu iria passar em um açougue, perto da pizzaria, e aí decidi ir lá para conversar”, disse.
Sinomar contou que, ao entrar na pizzaria, que ainda não estava funcionando, George apareceu, já armado. “Ele começou a gritar comigo, dizendo que eu teria o que merecia. Em seguida a Pérola entrou e depois a Kerolly. As duas pediam para ele abaixar a arma, mas ele respondeu com grosseria e as mandou calar a boca. Aí minhas filhas me puxaram e eu peguei meu celular, dizendo que iria chamar a polícia. Mas o George foi se aproximando e a gente saiu correndo”, afirmou.
O pai de Kerolly disse que o comerciante efetuou ao menos quatro disparos, sendo dois na calçada e dois enquanto eles entraram em uma farmácia para se esconder. Nas imagens das câmeras de segurança o pai aparece atrás da menina, no entanto, ela nega que a tenha usado como escudo. “Quando olhei para o lado a minha filha estava ferida e tinha batido a cabeça no vidro da farmácia. De maneira alguma eu tentei me esconder atrás dela, acho que foi o jeito que eu a puxei e ela acabou ficando na minha frente”, ressaltou.
Sinomar também negou que tenha ido ao comércio para brigar com George. “Meu pai me ensinou que a gente não deve fazer coisa errada, por isso voltei lá para pagar o vidro que eu quebrei, mas não sabia que iria dar nisso”, disse.
O juiz questionou Sinomar pelo fato dele não ter registrado um boletim de ocorrência contra George após a suposta ameaça, mas o homem não soube explicar os motivos que o levaram a tentar resolver a situação sozinho. “Não sou criminoso e nunca fui. Eu só queria dar um basta”, disse.
Logo depois, foi a vez de Pérola falar e ela pediu que George voltasse a audiência. Ao lado mãe, Miriam Coelho Alves, ela relatou o que aconteceu no dia do crime e ratificou o depoimento do pai. Segundo a garota, ao verem que Sinomar estava no meio de uma discussão, ela e irmã tentaram acabar com a confusão. “Eu fiquei do lado do meu pai e a Kerolly colocou a mãozinha na direção do George, implorando para que ele não atirasse. Em seguida, ela correu e foi pedir ajuda na farmácia e eu fiquei com o meu pai”, contou.
Segundo Pérola, a irmã só saiu da farmácia quando o comerciante já tinha efetuado o primeiro disparo. “Quando a Kerolly ouviu, saiu correndo. Aí ela veio e abraçou meu pai e foi quando ela foi atingida. Ele [George] ainda veio olhar se tinha acertado meu pai”, relatou a menina.
Pérola ressaltou que o pai é uma pessoa “nervosa”, mas que nunca agiu com truculência com ela e a irmã. “Com a gente ele é uma pessoa super boa. Ele foi lá para acertar as contas”, afirmou.
O promotor Milton Marcolino, do Ministério Público de Goiás (MP-GO), ainda ouviu uma terceira testemunha e dispensou as demais. “As provas colhidas já são suficientes para provar a culpa de George. Ele cometeu um crime de maneira sórdida e quis se colocar acima da lei. Não tenho dúvidas que ele irá a júri popular e será condenado”, afirmou.
Defesa - Em seguida começaram os depoimentos de defesa, a maioria de comerciantes que trabalhavam na mesma região que George. Um deles, Michel do Carmo Moura, contou que presenciou a primeira briga entre a dupla. “Eu estava na pizzaria com a minha família e fiquei assustado com o comportamento do Sinomar”, relatou. Sobre George, o homem disse que o conhece há mais de três anos e que nunca presenciou nenhum ato de violência praticado por ele.
Já o desempregado Eleniton Severino Dias disse que conhece tanto Sinomar quanto George de antes do crime e que o pai de Kerolly é uma pessoa perigosa. “Meu irmão tinha um comércio e já tinha sido ameaçado por ele”, relatou. A testemunha reforçou que o comerciante estava com medo da “má fama” de Sinomar.
Outras três testemunhas de defesa foram ouvidas, sendo que uma delas foi a mãe de Kerolly, Miriam Alves. A mulher contou que estava separada de Sinomar há seis anos e que tinha a guarda das filhas, mas que as deixou morar com o pai após ser ameaçada. “Ele vivia dizendo que se acontecesse algo com elas seria culpa minha, pois eu tinha que trabalhar e elas ficavam sozinhas. Aí acabei cedendo. Mas acho que elas foram mais por dó do pai do que por medo”, afirmou.
A mulher disse que já foi agredida por Sinomar e que isso resultou na separação. “Ele sempre foi nervoso, mas nunca vi ele atirando em alguém”, ressaltou. Por conta do episódio citado por Miriam, o serralheiro chegou a ser preso dias após a morte a filha. Ele tinha uma condenação por agredir a ex-mulher e não tinha cumprido a pena. Dois dias depois Sinomar foi liberado.
Comerciante - O juiz perguntou a George se ele queria responder ao interrogatório e, após conversar com seus advogados, ele optou por falar. O homem negou a intenção de matar as vítimas e disse que se arrepende. “Eu não conhecia o Sinomar antes da confusão e em momento algum exigi que ele pagasse pela pizza. Mas ele deu um murro no balcão e eu fiquei assustado. Ele me ameaçou dizendo que voltaria depois”, afirmou.
O comerciante disse que, no dia em que Kerolly foi baleada, Sinomar voltou e ficava o tempo todo com a mão nas costas, aparentando que poderia estar armado. “Eu estava com a arma, que comprei após ser vítima de assaltos. Durante a discussão, ele ficava o tempo todo se escondendo atrás das filhas. Só sei que atirei no rumo dele e só depois vi que tinha acertado a menina e fugi”, disse.
George também disse se lembra de ter disparado apenas um tiro, e não quatro, como destacam as vítimas. “Eu pensei que o tiro tinha acertado a menina de raspão. Só depois vi que não e decidi me entregar à polícia. Estou muito arrependido de tudo, pois isso abalou também a minha família”, ressaltou o comerciante.
Um dos advogados de defesa do comerciante, Dyellber Araújo, afirmou que acredita na absolvição do seu cliente. “Ficou claro que o George estava coagido, com medo de um homem perigoso. Quem agiu de forma errada foi o Sinomar, que expôs as filhas ao perigo”, destacou.
Ao término da audiência, o juiz Leonardo Fleury Curado Dias disse que as informações colhidas serão analisadas e que, só depois disso, será definido se George irá a júri popular.
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